Ética: uma visão psicanalítica.
Do grego ethikos, ética significa “costume”, “comportamento” e pode ser compreendida como a disciplina filosófica que estuda e questiona os sistemas morais elaborados pelos homens que delimita as normas e interdições de cada sistema.
A “Ética”, isto é, os valores que cada indivíduo carrega consigo ao longo de sua existência e que regulam a vida em sociedade, é a principal característica que nos difere dos animais, como já dizia Aristóteles.
Ser humano implica em possuir o sentimento do bom e do mau, do justo e do injusto. A partir deste conceito da Filosofia, associamos sempre o conjunto de práticas que regulam o comportamento humano às normas e regras estabelecidas para o bem-estar comum.
O olhar da Psicanálise sobre o tema extrapola as questões de bem ou mau e aborda as ações do sujeito, guiado por seu próprio desejo, levando em conta seu inconsciente e sua verdade. A verdade do sujeito, embora difícil de aceitar, é a de que há um mal-estar inerente à condição humana.
Vivemos agindo sobre tentativa e erro e, por isso, falhamos. Tais falhas fazem parte da constituição do psiquismo humano. “Humano, demasiado humano”, disse Nietzsche. A todo momento falhamos nas nossas escolhas e nas nossas atitudes, causando um mal e sendo injusto, como Lacan nomeou, de “falta a ser”. Isto é, esta falta, por ser necessária e não poder ser eliminada, sempre estará presente no homem.
Segundo Lacan (1997), a Ética “consiste essencialmente num juízo sobre nossa ação” e afirma que se há uma ética da psicanálise é na medida em que, de alguma maneira, por menos que seja, a análise fornece algo que se coloca como medida de nossa ação – ou simplesmente pretende isso”.
A constatação da eficácia da análise se dá pela observação do gozo/prazer obtido pelo sintoma e a construção de um saber próprio a partir da análise. Isso só é possível por meio da escuta analítica que possibilita a leitura do conteúdo inconsciente.
O processo analítico não depende apenas de uma técnica, mas também de uma ética, ao passo que a relação com o analista trabalha essas dimensões fundamentais que se estabelecem fora do setting terapêutico. No início do percurso do tratamento, cabe ao analista sustentar os preceitos éticos próprios da Psicanálise e, espera-se que, ao final, se torne também responsabilidade do analisando.
Assim, se faz necessária uma diferenciação entre o que é desejo do analista, de fazer o analisando melhor, daquilo que é desejo do paciente. Portanto – baseando-se na teoria lacaniana – o analista, muitas vezes é compreendido
pelo imaginário do paciente como aquele que vem para suprir a falta e aliviar a angústia.
Mas a Psicanálise atua além. Se o analista não dá vazão ao seu desejo na análise pessoal e este se sobrepõe no processo terapêutico com seu paciente, ele impossibilita que o analisando manifeste seu próprio desejo ou, em outras palavras, o analista precisa fazer aquilo que é didático e educativo para o desenvolvimento de seu paciente.
Não há como encurtar o caminho, o analista deve acolher o paciente em sua demanda, mas não deve dar as respostas prontas, impossibilitando que o analisando acesse seu próprio desejo. Sendo assim, só há análise,
enquanto técnica e ética, quando os desejos do analisando se mantem insatisfeitos.
Por exemplo, se o paciente faz determinada pergunta ao analista sobre alguma decisão que precisa tomar, o analista deve escutá-la sem responder a priori, entendendo que, muitas vezes, é a forma que o analisando encontra para “terceirizar” a responsabilidade, numa tentativa de se eximir de possíveis consequências.
“O desejo do analista que possibilita que o mesmo tenha uma postura ética e a disponibilidade para ouvir para além do dito, de tentar escutar o que aquele sujeito que está perante ele busca, com os mecanismos que possui, simbolizar” (Rosa, 2009).
Bibliografia:
ROSA, M. I. P. D; ROSA, A. C. A Ética na psicanálise. Akrópolis, Umuarama, v. 17, n. 1, p. 41-44, jan./mar. 2009.